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terça-feira, 15 de outubro de 2013

Fazendas no Namibe exploram crianças



Enquanto os jovens de diversos municípios da Huila emigram para várias partes do país, à procura de emprego nas empresas chinesas de construção civil e não só, as crianças, dos 12 aos 17 anos, acorrem às fazendas e armazéns grossistas no Namibe.

D escalço, com o tronco nu e as partes íntimas cobertas por um pano verde (com vários desenhos), amarado à cintura, calçando sandalha de borralha preta, o pequeno Tio cuidava das plantas de tomate, amarando-as em pequenos paus para que os legumes possam desenvolver-se sem tocar a terra, quando a equipa de reportagem de O PAÍS chegou à Fazenda Twaponwa, na pretérita Sexta-feira, 20.

Para conseguirmos comunicar com o adolescente que só domina a língua Nhaneka Humbi recorremos aos préstimos da sua patroa que prontamente acedeu ao nosso convite, uma vez que ela pertence a mesmo grupo étnico.

Embora não soubesse precisar a idade, o seu porte físico demonstrava estar entre os 12-13 ano. Segundo apuramos, ele e os seus progenitores desconhecem a existência do calendário, a mudança de séculos e levam a vida em função dos desafios que encontram em cada dia.

Com os braços cruzados e os pés firmes no chão, o seu rosto denunciava o estado de surpresa que se havia apossado dele, procurava responder às nossas questões de forma curta e concisa, com os olhos fixos nas lentes da câmara fotográfica.

O pequeno camponês contou que a sua família foi obrigada a abandonar temporariamente a aldeia de Camu papa para procurar água e alimentação. Localizada a cerca de 30 quilómetros do Morro Maluco (designação de um enorme morro que também pode ser visto da Huíla), a fazenda Twaponwa foi o local onde ele, os seus pais e os irmãos mais novos foram acolhidos há cerca de três meses.

Sobre o que pretende ser no futuro, disse desconhecer a existência de um futuro e que se sente bastante feliz com a actividade que realiza. O salário de cinco mil Kwanzas a que tem direito mensalmente é entregue aos seus progenitores pela entidade patronal e são eles quem decide o destino conveniente que deve ser dado ao mesmo.

Já a adolescente Minga que também não domina a língua de Camões e se encontrava com um traje típico do seu grupo étnico, isto é, com um pano amarelo com desenhos azuis amarado à cintura, combinando com as missangas brancas e amarelas enfeitando o peito descoberto, contou que não sabia quem lhe atribuiu este nome e por que razão o fez.

A forma cruzada com que se encontravam as missangas serviam para anunciar que estava solteira. As mulheres já comprometidas usam-nas sobre os seios. Mas este cenário está a ser alterado aos poucos, pelo facto de existirem muitas senhoras que já optam por se agasalhar com camisolas.

À semelhança de Tio, ela não sabia precisar a sua idade, mas, segundo o proprietário da Fazenda, acredita-se que já tenha atingido a fase da puberdade (o que se presume estar entre os 15-16 anos) pelo facto de já ter sido circuncisada, meses antes de ir para lá à procura de emprego, em companhia dos seus progenitores.

Ela contou que era a sua primeira vez a trabalhar numa fazenda, convivendo com indivíduos de outras etnias e que se sentia realizada com a actividade. Contrariamente ao seu colega que parecia tentar dominar um aperente desconforto, este apossouse completamente da nossa interlocutora, que respondia as questões com as mãos junto à boca.

Indagada se gostaria de frequentar uma escola, demonstrou ter total desconhecimento sobre a existência de escolas, professores e o que lá se faz.

Disse ainda que sente-se feliz com a vida que tem e que não sabe o que quer ser quando crescer. Enquanto as crianças prestavam declarações à nossa equipa de reportagem, as senhoras acompanhavam tudo de perto, debaixo da sombra de uma árvore e os homens, faziam-no a cerca de 25 metros de distância.

Ambos partilham o serviço de amarrar os tomateiros e alimentar os animais, em troca de cinco mil Kwanzas por mês, ao passo que os trabalhos mais pesados da fazenda estão sob a responsabilidade dos seus pais que auferem mensalmente 25 mil Kwanzas. Para além dos valores acima mencionados, os camponeses têm direito a alimentação e alojamento em tendas de campismo.

Nesta propriedade, os funcionários deixaram para trás as casas de adobe típicas das aldeias e as camas feitas de pau e passaram a dormir em colchões de esponja. Na fazenda, que dista 100 quilómetros da cidade, O PAÍS encontrou trabalhadores de diversas partes das províncias do Namibe e da Huíla que se viram forçados a abandonar as suas áreas de origem por causa da estiagem.

Entre eles, estavam duas jovens grávidas, em companhia dos seus esposos. Armando Chicoca, o proprietário da fazenda, explicou que tão logo se aproximem do serviço de parto, serão enviadas às suas aldeias para darem à luz. Os jovens se recusaram a falar à reportagem.

Condições de trabalho garantidas

O secretário do Soba de Mohombo, vulgo Geral de Cima, António Francisco Cassua, contou que a província do Namibe tem sido o local escolhido por centenas de crianças, dos 12 aos 17 anos, originárias da Huila com o intuito de vencerem na vida e contribuírem no sustento das suas famílias.

Só nesta comunidade existem mais de duzentas crianças provenientes de diversas aldeias dos municípios da Chibia, Quipungo e Chicomba (Huila) a trabalharem em fazendas. Estes dados constam de um levantamento feito recentemente pelas autoridades tradicionais do Mohombo.

De maneira a não haver qualquer discrepância nos salários e a valorizar a mão-de-obra, os fazendeiros daquela região acordaram em fixar o ordenado dos funcionários menores de idade em cinco mil Kwanzas mês.

A par do salário, a entidade patronal está ainda encarregue de arcar com as despesas inerentes a alimentação, alojamento, vestuário e de tratamento médico, em caso de doença.

Os contratos de trabalho variam de quatro a cinco meses, dependentemente das plantações que estiverem em curso. Caso seja de tomate, os trabalhadores permanecem até chegar a época da colheita para puderem receber os seus ordenados tão logo sejam comercializados os produtos.

“Assim que o contrato chega ao fim elas regressam às suas zonas de origem com dinheiro (entre 20 a 25 mil Kwanzas) para ajudarem as suas famílias e depois voltam acompanhadas de outras crianças, isto é, se foram dez voltam 20, porque cada uma delas recruta uma de forma espontânea”, disse.

Segundo ele, a falta de escolas e a fome podem ser apontadas como factores que têm contribuído para o aumento do fluxo migratório de crianças da província da Huila para o Namibe, a fim de conseguirem emprego nas áreas rurais ou na cidade (como estivadores).

“Na maior parte das aldeias, as poucas escolas que existem só leccionam da iniciação a 4º classe, o que tem feito com que muitas crianças fiquem fora do sistema de ensino e, consequentemente, só têm dois caminhos a seguir: enveredar pela vida do crime ou emigrar em busca de emprego”, justificou.

Para além da actividade agrícola, muitos deles trabalham como estivadores em diversos armazéns de grossistas que existem na cidade do Namibe e noutras cedes municipais.

Questionado se têm recebido de denúncias de maus tratos por parte das entidades empregadoras, à semelhança do que acontece com muitos jovens que são recrutados para trabalharem em empresas de construção civil chinesas, conforme O PAÍS noticiou na edição passada, o secretário do Soba mostrou-se incrédulo e descartou qualquer possibilidade disto ocorrer na sua zona de jurisdição.

“O soba representa a autoridade de uma determinada área e não deve admitir que os fazendeiros tratem as crianças de forma desumana. Recebemos algumas denúncias deste género e fomos prontamente averiguar e constatamos que eram denúncias falsas”, disse.

Ele negou a existência de casos de abusos sexuais contra menores e assegurou que elas não fazem trabalhos forçados. Afirmou ainda que com a implementação no sistema gota a gota (uma mangueira com vários furos) nas lavras o trabalho tornou-se menos fastidioso.

A substituição da agricultura manual pela mecanizada, isto é, das enxadas pelos tratores, tem tornado o serviço mais leve para os petizes.

De acordo com o nosso interlocutor, o primeiro grupo que se deslocou ao Namibe com este objectivo, isto é, há dois anos, tinha fugido de suas famílias por causa das dificuldades que há nas suas aldeias.

Só que, como regressaram com dinheiro, os pais não deram nenhum correctivo e acabaram por incentivalos ainda mais. Tendo em conta que com valores conseguiram não só aumentar a quantidades de animais no curral (o que pare eles é sinónimo de riqueza) como também compraram alimentos.

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Momentos Inesquecíveis



"Momentos que ficaram eternizados em nossas memórias, a realização de um sonho o começo de uma nova História..."

sexta-feira, 21 de junho de 2013

O dia em que o Gigante Percebeu o Mal que o Mosquito Faz

O dia em que o Gigante Percebeu o Mal que o Mosquito Faz

O dia 18 de Junho De 2013 vai ficar marcado na história, mesmo em meio á um turbilhão de reivindicações o que de fica claro é que esse Gigante chamado Brasil está cansado de ver uma minoria autoritária disfarçada de Democracia sugar seu sangue como um mosquito. A população saiu ás ruas para expressar seus mais sinceros sentimentos como que acordada de súbito de sua quase eterna anestesia social, a mídia não sabe de que lado se posiciona, fica o tempo inteiro instigando a massa a sair ás ruas e quando isso acontece se preocupa mais com alguns vândalos do que com a essência do manifesto.

"Pra frente Brasil salve o povo Brasileiro"



O início da virada

quarta-feira, 29 de maio de 2013

A reforma protestante e o direito à resistência

Martinho Lutero fala perante o Imperador Carlos V na Dieta de Worms, em abril 1521, antes de ser considerado herege pela Igreja Católica por causa dos ideiais que defendia Foto: Getty Images

Desde o começo da Reforma Religiosa, com a exposição das 95 teses de Martim Lutero, em Wittemberg, Saxônia, em 31 de outubro de 1517, as lideranças protestantes enfatizaram sua obediência às autoridades instituídas, isto é, aos príncipes e ao Imperador do Sacro Império Romano-Germano (no caso, Carlos V). Imaginavam, tanto Lutero como Calvino, promover uma mudança teológica e eclesial em que nada alterasse a ordem política em que viviam. Queriam, até então, que a Teologia ficasse distante da Política, ocupando postos bem separados. Naqueles inícios, ainda se apoiavam na Teoria da Obediência Passiva herdada dos primórdios do Cristianismo.

O começo da perseguição religiosa Todavia, não foi este o entendimento das autoridades imperiais e papais que gradativamente começaram a dar caça aos reformadores dissidentes e retirar-lhes qualquer vantagem no tocante à liberdade religiosa. A tolerância que haviam demonstrado na Dieta de Worms, de 1521, sofreu uma reviravolta oito anos depois. Ninguém, na ocasião, poderia imaginar que isto provocaria o surgimento da Doutrina do Direito à Resistência que, segundo Quentin Skinner, seria a base dos movimentos reformistas e revolucionários modernos (ver "As fundações do pensamento político moderno", 1996). Os começos do século XVI na Europa Ocidental anunciavam-se turbulentos. O Sacro Império Romano-Germano e o Papado sentiam-se ameaçados pelos surtos de desobediência dos príncipes e dos vários movimentos utópicos de sedição religiosa que eclodiam aqui e ali por todo o Império.

Naturalmente que, tanto o Trono como a Mitra agia de comum acordo em manter a coesão política e religiosa da Europa Cristã Ocidental e passaram a temer que os seguidores de Lutero, descontentes, começassem a minar tal unidade. Se o imperador Carlos V mostrou-se impotente em dobrar o monge alemão, alguns anos depois, revolveu tomar medidas mais repressivas.

A situação política a favor do Império se desanuviara no ano de 1529. Os turcos islamitas de Solimão, o Magnífico, haviam sido obrigados a se retirar dos limites de Viena e o rei da França Francisco I havia sido abatido por Carlos V. Sentindo-se fortalecido pelo êxito diplomático e militar, o imperador decidiu remover, pela Dieta de Speyer, de 1529, as outorgas que fizera anteriormente aos luteranos. Estes (8 príncipes e 14 cidades liderados por Johan Von Brandenburg-Ansbach e Phillip Von Hesse) enviaram os seus protestos, sem que isto provocasse o recuo de Carlos V (desde então foram denominados como protestantes). Na nova dieta marcada para ser realizada na cidade imperial de Augsburg, na Suábia, no ano seguinte, eles apresentaram o que passou a se chamar a Confissão de Augsburg (Augsburger Konfession, 1530), redigida pelo humanista luterano Phillip Melancheton (documento que, com seus 26 artigos, se tornou, nos anos seguintes, um verdadeiro manual do protestantismo). Os teólogos católicos refutaram-na com a Contestação Papal (Confutatio Pontifícia), fazendo com que o imperador exigisse a submissão dos luteranos. O resultado direto desta determinação fez com que os dissidentes, antevendo perseguições, se reunissem na Liga Protestante (1530). Os príncipes e teólogos luteranos viram-se frente ao problema de resistir ao imperador, pois eles não admitiam a interferência da Coroa nas questões de consciência e de fé. Sábios juristas alemães foram então convocados a darem pareceres para determinar quais os instrumentos legais poderiam sustentar a sua causa. Argumentos jurídicos

Os mestres-das-leis consultados pelos príncipes basearam-se tanto na Teoria Feudal (que dava autonomia legislativa aos barões e condes) como na Constituição Imperial (que permitia uma ampla possibilidade de ação dos nobres em casos legais) para embasar seus pareceres. Desde os tempos mais remotos, as regiões alemãs do Sacro Império tinham sua própria Dieta e obedeciam aos códigos locais.

Por exemplo, em 1225, os saxônios codificaram suas leis no 'Espelho Saxônico' (Sachsenspiegel), o mesmo ocorrendo com os suábios (Schwabenspiegel). Eles garantiam a autonomia de seus povos face ao poder central, fragilmente mantido por um corpo de burocratas (Dienstmannen)*. Os juristas entendiam que, do mesmo modo que o imperador não tinha o costume de intervir nelas, o mesmo se dava nos assuntos pertinentes à fé. Disseram então a Phillip Von Hesse que era possível sim enfrentar o imperador, pois que ele estava ultrapassando os limites do seu cargo, não havendo ilicitude alguma em combatê-lo. Esta ainda não era a posição de Lutero já que, quando foi procurado por Johann da Saxônia, tentou dissuadi-lo de opor-se ao soberano dizendo-lhe que devia continuar obediente 'mesmo que ele (Carlos V) atentasse contra o Evangelho'. Pouco tempo depois, o líder reformador, que havia sido ameaçado por sicários, mudou de ideia. Para os juristas auscultados, o imperador portava-se como um tirano ao querer forçar os protestantes a serem reintegrados no corpo da comunidade cristã por ele presidida. Além disso, acumulava-se no horizonte da Europa Ocidental uma enorme nuvem da reação católica pronta a desabar sobre os 'hereges'**. * Ver Ricardo da Costa, Anais do IV Encontro Internacional de Estudos Medievais - IV EIEM, 2003 ** Na França, Henrique II determinou pelo Édito de Fontainebleau, de 1540, que se executasse qualquer dos hereges. A Câmara Ardente (a Chambre ardente), instituída por ele, um tribunal sinistro criado especialmente para julgar os huguenotes, proferiu mais de 500 condenações. Pelo Édito de Compiège, assinado por Francisco II, em 1557, renovou-se o castigo de morte para as heresias, impulsionando novas perseguições, o que levou o reino à sua primeira guerra religiosa (1561). Na Inglaterra, a partir de 1557, a rainha Mary Tudor, apoiada pelo Arcebispo da Cantuária, Reginald Pole, decretou as 'perseguições marianas' aos protestantes, mandando 300 deles para as fogueiras da purificação. Desde então a apelidaram de Maria, a Sanguinária (Bloody Mary).

Lutero respondeu àquela situação com a edição da 'Advertência do doutor Lutero ao seu querido povo alemão' (1531), na qual denunciou que os seguidores do Papado estavam se preparando para uma guerra. Consequentemente 'não podiam os magistrados ser legítimos', uma vez que estavam agindo 'com força injusta', apoiando-se 'no poder dos punhos'. Caso estoure a guerra, ele não reprovará os que resistirem aos 'papistas assassinos e sanguinários', pois serão 'ações de legítima defesa'.

A Doutrina da Resistência Ativa

Desde que o imperador extrapole seus poderes, se torna um agressor, sendo assim necessário resistir-lhe. O humanista e teólogo Philip Melanchethon, cognominado mais tarde como 'o preceptor da Alemanha' (Praeceptor Germaniae), acompanhou-o na argumentação. No seu tratado 'Do ofício do Príncipe', de 1539, assegurou que se o magistrado atormenta o súdito com injúrias atrozes e notórias, é perfeitamente legal que ele se defenda impelido pela aversão 'à violência imposta'. Os protestantes começaram a se sentir como se estivessem nos primeiros tempos do cristianismo, ocasião em que os césares romanos os tratavam como subversivos jogando-os nas arenas das feras.

Martin Lutero e Philip Melanchethon, em vista disto, substituíram então a Doutrina da Obediência Passiva pela da Resistência Ativa. Deste modo, foi a política imperial crescentemente intolerante, somada aos rigores punitivos da Contrarreforma católica, iniciada em 1545, que fez com que os cabeças da Reforma abandonassem a Doutrina Paulina da Não-resistência. Antes das perseguições se intensificarem, o reformador genebrino defendia uma posição ultraconservadora. Entendia que os príncipes por serem 'ministros de Deus' e 'representes de Deus', fossem os regimes aristocráticos ou democráticos, todos eram instituídos por Deus.

Jamais, enfatizou Calvino, deveria haver reação ao comando do magistrado: desobedecê-lo 'era resistir a Deus'. Chegou (no Instituto) ao extremo de afirmar que quando Deus enviava um Tirano ele o fazia 'para punir impiedosamente o povo', não sendo tolerável qualquer oposição. O melhor, concluiu ele, era 'obedecer e sofrer'*. * Estas considerações de Calvino eram decorrentes do surgimento dos anabatistas (rebatizadores) em 1525 - simultâneo a grande rebelião dos camponeses alemães, a Bauerkrieg. Tratou-se de um movimento radical que fez parte do que, em alemão, denominou-se de radikalreformatorisch Christian ou os 'protestantes do protestantismo', pois propunha um tipo de comunismo cristão e a separação do Estado da Igreja (eram pacifistas e favoráveis à poligamia), rejeitando igualmente a burocracia sacerdotal. Em fevereiro de 1534, eles, liderados por Johan Matthys, e depois por Johan de Leida (que se proclamou rei), destituíram o conselho da cidade de Münster e assumiram o controle, proclamando-a como a 'Nova Sião', instaurando uma política de perseguição aos outros protestantes (luteranos) e aos católicos. Várias revoltas de anabatistas ocorreram então em Groningen, na Frísia e na Holanda, sem nenhum sucesso. Münster foi tomada de assalto cinco meses depois e os líderes anabatistas, denominados de 'apóstolos', foram barbaramente torturados e executados em janeiro de 1536 pelos acólitos do Bispo de Münster, que recebeu apoio do Império para por a cidade em sitio e recuperá-la. Os menonitas, os huteristas e os Amish, que imigraram para a América, consideram-se descendentes dos anabatistas.

As Teorias de Gregor Von Brück e Martin Bucer Chanceler do príncipe eleitor Frederick der Weise, Frederico o Sábio, da Saxônia, e do sucessor dele Johan Frederick I, Gregor Von Brück (sogro do pintor renascentista Lucas Cranach, o Jovem, que aderira à Reforma), partindo do princípio que 'em questões de fé o imperador não possuía jurisdição alguma', elencou os três tipos de situação na qual a resistência 'ao magistrado' era possível: 1) Se foi feita a apelação; 2) Se o magistrado age fora da sua jurisdição legal; 3) Se age injustamente e o dano causado for irreparável.

Nos dois últimos casos, observou Von Brück, ele não está mais atuando como um juiz, cabendo então mover-lhe resistência. Esta súmula recebeu a aprovação de todos os teólogos protestantes de destaque (Melanchton, Jonas e Spalain), endossando-a sem qualquer reparo. A ela Lutero acrescentou outra justificativa. A ação do imperador podia ser separada em dois atos:
1) Os genuínos: que dizem respeito às prerrogativas dele expressas na constituição imperial e que são naturalmente legítimos e devem ser acatados;
2) Os tirânicos: que nascem do destempero da autoridade máxima e que merecem ser repudiados e enfrentados. No prefácio que escreveu para a edição do livro de Johann Brismann ('Comentário sobre o Apocalipse'), Lutero radicalizou ainda mais afirmando que 'o papado deve ser interpretado como o reino do anticristo', do qual devemos nos defender contra a 'fúria tirânica do Papa'.

Outra contribuição à oposição dos poderes excessivos que o imperador reivindicava como sua prerrogativa de interferir na fé dos súditos foi do teólogo franco-alemão Martin Bucer (in 'Livro dos Comentários sobre o livro dos juízes', 1527-1530), que, nascido na França, exilara-se em Strasbourg, na Alsácia, quando passou a se chamar de Martin Butzer, para fazer da cidade uma fortaleza da Nova Religião.

Muito próximo a Philip Melanchthon, argumentou o absurdo em acreditarem que Deus concedera autoridade a um só homem, quando na verdade ele o dispersou entre muitas outras pessoas, por um conjunto de magistrados inferiores e por uma autoridade superior (potestas superior), sendo todos eles portadores do merum imperium e capazes de empunhar a espada (jus gladium). Se autoridade superior não defende a vida e os bens dos súditos, os magistrados inferiores não precisam mais obedecê-lo, assegurando que o desdobramento disso permitiria que a autoridade superior fosse deposta pela força das armas. Claramente era uma doutrina de negação ao absolutismo e da exaltação do compartilhamento do poder por outros setores da sociedade (ver Confissão de Magdenburgo).

Em razão da supressão das garantias dadas anteriormente por Carlos V, o debate entre os ativistas e teólogos protestantes sobre como atuar naquelas circunstâncias cada vez mais dramáticas se estendeu ao encontro realizado no Palácio de Torgau, na Saxônia do Norte, a partir de 25 de outubro de 1530, quando eles colocaram em pauta a questão da 'resistência legítima', chegando também à conclusão que era preciso lutar, 'ainda que o próprio imperador nos ataque'. Foi neste cenário que surgiu a Liga de Esmalcalda (Schmalkaldischer Bund), fundada em 27 de fevereiro de 1531 na cidade do mesmo nome, tornada no primeiro escudo dos príncipes protestantes contra os avanços de Carlos V*.

* A Liga de Esmalcalda foi fundada por Philip von Hesse e Johan Frederick I, Eleitor da Saxônia, que se comprometeram a defender-se mutuamente caso seus territórios fossem atacados pelo imperador do Sacro Imperador Romano. As cidades de Anhalt, Bremen, Brunswick-Lüneburg, Magdeburgo, Mansfeld, Strasburg e Ulm também se encontravam entre os membros fundadores. Konstanz, Reutlingen, Memmingen, Lindau, Biberach an der Riß, Isny im Allgäu e o porto de Lübeck juntaram-se a ela posteriormente, no que se pode considerar um primeiro esboço da unidade nacional alemã. Em 1532, a Liga aliou-se à França e, em 1538, à Dinamarca. Ela raramente provocava Carlos V de maneira direta, mas confiscou terras da Igreja, expulsou bispos e príncipes católicos que viviam dentro da sua área de controle e apoiou a propaganda luterana pelo norte da Europa. Todavia, foi amplamente derrotada pelo exército imperial na batalha de Mühlber, de 27 de abril de 1547, tendo sua liderança desbaratada.

As Guerras de Religião

O consenso entre os seguidores de Lutero em torno da Doutrina do Direito à Resistência Ativa abriu o campo para a grande guerra civil da Cristandade que ensanguentou boa parte da Europa até a assinatura do Tratado de Westfália, de 1648, que pôs fim à Guerra de Trinta Anos travada entre as nações protestantes e a Liga Católica. Esta autonomia frente ao poder opressor não somente marca o fim da Doutrina Paulina da Eterna Obediência como irá, mais tarde, inspirar os pensadores liberais como John Locke e Jean-Jacques Rousseau, ambos de formação protestante, que se manifestam contra a concentração excessiva de poder nas mãos dos monarcas, fomentando um a Gloriosa Revolução de 1688-1689 e, o outro, as Revoluções Americana de 1776 e Francesa de 1789.

Bibliografia Cohn, N. The Pursuit of the Millennium. The Egalitarian Millennium, Nova York 1961. Delumeau, Jean. Mil anos de felicidade. Lisboa: Editora Terramar, 1997. Elton, G.R. A Europa durante a Reforma (1517-1559). Lisboa: Presença/Martins Fontes, 1996. Perry, R. B. Puritanism and Democracy, Nova York 1944. Squiner, Quentin. As fundações do pensamento político moderno. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. Fonte: VOLTAIRE SCHILLING

Biografia Abraham Lincoln



Biografia de Abraham Lincoln:

Abraham Lincoln (1809-1865) foi presidente dos Estados Unidos da América. Foi o presidente que emancipou os escravos de seu país, Lincoln é considerado um dos inspiradores da moderna democracia e uma das maiores figuras da história americana.

Abraham Lincoln nasceu em Hodgenville, Kentucky, em 12 de fevereiro de 1809. Filho de lavradores, desde cedo teve de trabalhar arduamente. Aos sete anos foi para Indiana com a família, em busca de melhor situação econômica. Pouco depois perdeu a mãe, e o pai casou-se outra vez. Devido à dificuldade de encontrar uma escola no novo domicílio e desejoso de progredir, o jovem Lincoln pedia livros a amigos e vizinhos para ler depois das tarefas diárias. Empregou-se numa serraria e mais tarde em barcos dos rios Ohio e Mississipi.

Em 1836, aprovado em exames de direito, tornou-se um advogado muito popular. No ano seguinte, sua família mudou-se para Springfield, Illinois, onde Lincoln encontrou melhores oportunidades profissionais. Casou-se em 1842 com Mary Todd, mulher inteligente e ambiciosa.

Início político

Filiado ao partido whig (conservador), Lincoln, entre 1834 e 1840, havia se elegido quatro vezes para a assembléia estadual, onde defendera um grande projeto para a construção de ferrovias, rodovias e canais. Nessa época, sua atitude diante do abolicionismo era reservada. Embora considerasse a escravatura uma injustiça social, temia que a abolição dificultasse a administração do país.

Entre 1847 e 1849, foi representante de Illinois no Congresso, onde propôs a emancipação gradativa para os escravos, tese que desagradou tanto aos abolicionistas quanto aos escravistas. Mais decisiva foi sua oposição à guerra no México, que o fez perder muitos votos. Sem conseguir se reeleger, afastou-se da política durante cinco anos.

Presidência

A guerra contra o México ampliara o território da União e não era possível prever se a população das novas terras se declararia a favor da escravidão. Instalou-se uma grande polêmica nacional. Lincoln assumiu atitude antiescravagista e transformou-se no paladino dessa tendência após o debate que travou com o senador democrata Stephen Douglas.

Em 1858, candidato ao Senado pelo novo Partido Republicano, perdeu as eleições para Douglas, mas tornou-se líder dos republicanos. Em 1860, disputou o pleito para a presidência da república e elegeu-se o 16º presidente dos Estados Unidos.

Guerra de secessão

Ao iniciar seu governo, em 4 de março de 1861, Lincoln teve de enfrentar o separatismo de sete estados escravistas do sul, que formaram os Estados Confederados da América. O presidente foi firme e prudente: não reconheceu a secessão, ratificou a soberania nacional sobre os estados rebeldes e convidou-os à conciliação, assegurando-lhes que nunca partiria dele a iniciativa da guerra. Os confederados, porém, tomaram o forte Sumter, na Virgínia Ocidental.

Lincoln encontrou o governo sem recursos, sem exército e com uma opinião pública que lhe era favorável somente em reduzida escala. Com vontade férrea, profunda fé religiosa e confiança no povo, iniciou uma luta que primeiramente lhe foi adversa. Só conseguiu armar sete mil soldados, com os quais começou a guerra. Num só ano, decuplicou o Exército, organizou a Marinha e obteve recursos. Os confederados haviam consolidado sua situação, com a adesão de mais quatro estados aos sete sublevados. Em meados de 1863 chegaram à Pensilvânia e ameaçaram Washington. Foi nesse grave momento que se travou, em 3 de julho de 1863, a batalha de Gettysburg, vencida pelas forças do norte.

Lincoln, que decretara a emancipação dos escravos e tomara outras providências liberais, pronunciou, meses depois, ao inaugurar o cemitério nacional de Gettysburg, o célebre discurso em que definiu o significado democrático do governo do povo, pelo povo e para o povo, e que alcançou repercussão mundial.

A guerra continuou ainda por dois anos, favorável à União. Lincoln foi reeleito presidente em 1864. Em 9 de abril de 1865, os confederados renderam-se em Appomattox.

Embora considerado conservador ou reformista moderado no início da presidência, as últimas proposições de Lincoln foram avançadas. Preparava um programa de educação dos escravos libertados e chegou a sugerir que fosse concedido, de imediato, o direito de voto a uma parcela de ex-escravos. Inclinou-se também à exigência dos radicais por uma ocupação militar provisória de alguns estados sulistas, para implantar uma política de reestruturação agrária.

Em 14 de abril de 1865, Lincoln assistia a um espetáculo no Teatro Ford, em Washington, quando foi atingido na nuca por um tiro de pistola desferido por um escravista intransigente, o ex-ator John Wilkes Booth. Transportado para uma casa vizinha, Lincoln morreu na manhã do dia seguinte.

Fonte:http://hid0141.blogspot.com.br/2012/02/abraham-lincoln.html

terça-feira, 14 de maio de 2013

Assembléia de Deus Origem no Brasil



“[...] Pouco tempo depois de Gunnar Vingren participar de uma convenção de igrejas batistas em Chicago, essas igrejas que aceitavam o Movimento Pentecostal, ele conheceu outro jovem sueco que se chamava Daniel Berg. Esse jovem também fora batizado com o Espírito Santo.

Após uma ampla troca de informações, experiências e idéias, Daniel Berg e Gunnar Vingren descobriram que Deus os estavam guiando numa mesma direção, isto é, o Senhor desejava enviá-los com a mensagem do Evangelho à terras distantes, mas nenhum dos dois sabia exatamente para onde seriam enviados. Algum tempo depois, Daniel Berg foi visitar o pastor Vingren em South Bend, Indiana (EUA). Durante aquela visita, quando participavam de uma reunião de oração, o Senhor lhes falou através de uma mensagem profética que eles deveriam partir para pregar o Evangelho e as bênçãos do Avivamento Pentecostal. O lugar tinha sido mencionado na profecia: Pará. Nenhum dos presentes conhecia aquela localidade. Após a oração, os dois jovens foram a uma biblioteca à procura de um mapa que lhes indicasse onde o Pará estava localizado. Foi quando descobriram que se tratava de um estado do norte do Brasil”. (Adaptado de “História das Assembléias de Deus, Emílio Conde – CPAD”).

Daniel Berg e Gunnar Vingren: missionários suecos fundadores da Assembléia de Deus no Brasil

Primeiro templo da Assembléia de Deus no Brasil

No início do século XX, apesar da presença de imigrantes alemães e suíços de origem protestante e do valoroso trabalho de missionários de igrejas evangélicas tradicionais, nosso país era ainda quase que totalmente católico. A origem das Assembléias de Deus no Brasil está no fogo do reavivamento que varreu o mundo por volta de 1900, início do século XX, especialmente na América do Norte.

Os participantes deste reavivamento foram cheios do Espírito Santo da mesma forma que os discípulos e os seguidores de Jesus durante a festa Judaica do Pentecostes, no início da Igreja Primitiva (Atos 2). Assim, eles foram chamados de “pentecostais”. Exatamente como os crentes que estavam no Cenáculo, os precursores do reavivamento do século 20 falaram em outras línguas, que não as suas originais, quando receberam o batismo no Espírito Santo. Outras manifestações sobrenaturais, tais como profecia, interpretação de línguas, conversões e curas, também aconteceram.

Quando Daniel Berg e Gunnar Vingren chegaram a Belém do Pará, em 19 de novembro de 1910, ninguém poderia imaginar que aqueles dois jovens suecos estavam para iniciar um movimento que alteraria profundamente o perfil religioso, e até social, do Brasil por meio da pregação de Jesus Cristo como o único e suficiente Salvador da humanidade e a atualidade do Batismo no Espírito Santo e dos dons espirituais. As igrejas existentes na época – Batista de Belém do Pará, Presbiteriana, Anglicana e Metodista – ficaram bastante incomodadas com a nova doutrina dos missionários, principalmente por causa de alguns irmãos que se mostravam abertos ao ensino pentecostal. A irmã Celina de Albuquerque, na madrugada do dia 18 de junho de 1911, foi a primeira crente a receber o batismo no Espírito Santo, o que não demorou a ocorrer também com outros irmãos.

Segundo templo da Assembléia de Deus no Brasil

O clima ficou tenso naquela comunidade, pois um número cada vez maior de membros curiosos visitava a residência de Berg e Vingren, onde realizavam reuniões de oração. Resultado: eles e mais dezenove irmãos acabaram sendo desligados da Igreja Batista. Convictos e resolvidos a se organizar, fundaram a Missão de Fé Apostólica em 18 de junho de 1911, que mais tarde, em 1918, ficou conhecida como Assembléia de Deus.

Em poucas décadas, a Assembléia de Deus, a partir de Belém do Pará, onde nasceu, começou a penetrar em todas as vilas e cidades até alcançar os grandes centros urbanos como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Porto Alegre. Em virtude de seu fenomenal crescimento, os pentecostais começaram a fazer diferença no cenário religioso brasileiro. De repente, o clero católico despertou para uma possibilidade jamais imaginada: o Brasil poderia vir a tornar-se, no futuro, uma nação protestante.

Fonte: CPAD - Casa Publicadora das Assembléias de Deus (www.cpad.com.br)

Daniel Berg e Família

Gunnar Vingren e Família

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Uma nova História

São Vicente, primeira vila do Brasil, teve geografia alterada após onda gigantesteca
Em 1541, uma onda gigante atingiu São Vicente, a primeira vila do Brasil. Prédios foram destruídos e o núcleo urbano teve de trocar de lugar

Afalta de registros confiáveis impede que se saiba ao certo o que aconteceu no final do ano de 1541 na primeira vila fundada no Brasil, São Vicente, erguida numa ilha do litoral de São Paulo. Uma "onda gigante" teria arrasado o lugar. O cataclismo que atingiu a vila, então com cerca de 150 habitantes, foi relatado por frei Gaspar da Madre de Deus no século 18, com base nas atas da Câmara. Lendo os textos, o religioso descobriu e registrou: "Hoje é mar o sítio onde esteve a vila".

Em 1º de janeiro de 1542, a Câmara da vila não tinha onde funcionar e seus integrantes rumaram para uma igreja que resistiu à inundação. "A Câmara voltou a se reunir em uma igreja em 11 de março e 1º de abril", afirma a historiadora Wilma Therezinha Fernandes de Andrade, coordenadora do Centro de Documentação da Baixada Santista e professora da Universidade Católica de Santos (Unisantos) - ou seja, a reconstrução não foi imediata, o que mostra o tamanho do estrago.



O historiador Mario Neme, usando as referências de frei Gaspar, escreveu em Notas de Revisão da História de São Paulo que "em fins de 1541, verifica-se a destruição pelas águas do mar de diversas construções da vila, entre as quais a conhecida ‘casa de pedra’ ou fortaleza, da qual não se volta mais a falar e não é encontrada dez anos depois por Tomé de Sousa, quando visita a capitania de São Vicente". De acordo com Neme, com base em esclarecimentos deixados pelo espanhol Alonso de Santa Cruz, "a ilha de Urubuqueçaba [perto da praia de José Menino, em Santos] devia fazer parte das terras marginais, que, cobertas pelo mar em fins de 1541, teriam deixado à mostra apenas a porção mais elevada da rocha". O fenômeno, como se vê, não apenas destruiu boa parte das construções. Também alterou a geografia da região, com efeitos que seriam sentidos pelos habitantes do lugar.

Relatos dão conta que uma onda gigante teria deixado submersos dois importantes ícones da vila: a Igreja Matriz, o maior prédio de São Vicente, e o pelourinho, símbolo da autonomia municipal e onde novas leis eram lidas para

a população. Índios, mamelucos e os poucos europeus do lugar viviam de uma economia de subsistência, que ganhava fôlego quando os não muitos navios que passavam por ali a caminho do Rio da Prata eram reabastecidos. Naquela época, explica o arquiteto Rubens Gianesella, as construções na colônia eram precárias, de pau a pique ou de taipa de pilão (com argamassa de terra preparada em forma de madeira e socada com pilão) e cobertas com sapé. Por isso, eram muito frágeis. "Qualquer ressaca mais forte, dessas que vemos invadir calçadas e ruas, poderia ter destruído as edificações da vila", afirma.

Somente em 1543 os membros da Câmara solicitaram ao governo local o resgate de dois ícones da vila que estavam submersos: os sinos de bronze da Igreja Matriz e o pelourinho. Para as operações, o procurador da Câmara, Pedro Colaço, recebeu 50 réis por providência. Foram dados ainda 300 réis para Jorge Mendes, responsável por retirar o pelourinho da água, mais 20 réis para transportá-lo até outro local e outros 250 réis para Jerônimo Fernandes, que ficou com a tarefa de reerguê-lo. "Assim, o conselho gastou 620 réis para fazer o primeiro trabalho subaquático que se tem notícia do Brasil, quem sabe das Américas", observa Wilma Therezinha. O pelourinho se encontra hoje no Museu Paulista da USP, conhecido como Museu do Ipiranga.

Em 1555, ordenou-se a construção de uma nova Igreja Matriz, cerca de 300m acima do nível do mar e com os fundos voltados para o Atlântico. Ela está no mesmo lugar ainda hoje, depois de uma restauração no século 18. A onda gigante mexeu com o futuro da vila, fundada por Martim Afonso de Sousa em 1532 - ele se tornaria o donatário da Capitania de São Vicente. O porto, que funcionava como fonte da economia do lugar, mudou-se para onde está até hoje, no norte da ilha, que também é chamada de São Vicente. A mudança ocorreu a mando de Brás Cubas, fundador de Santos, e fez com que o novo porto se tornasse muito mais atraente para as embarcações - mas a contrapartida foi o crescimento de Santos em detrimento da vila original (hoje, as duas cidades dividem a ilha). "O porto das naus original foi bastante prejudicado no episódio e passa a não ter mais a função que tinha antes, por causa do assoreamento da baía", acrescenta o historiador Marcos Braga, coordenador da Casa Martim Afonso, em São Vicente. Além do porto, a vila como um todo também mudou. Foi reconstruída um pouco mais acima do nível do mar, ao redor da nova Igreja Matriz, na Praça João Pessoa. Quem caminha pelo centro histórico percebe que o local está em uma parte mais elevada em relação ao nível do mar do que a Biquinha de Anchieta, região de topografia mais baixa, onde a vila se concentrava antes de 1541.

Mas, afinal, o que devastou São Vicente? As opiniões se dividem entre uma grande ressaca e um improvável maremoto (veja o quadro acima). O oceanógrafo Michel Michaelovitch de Mahiques, da USP, trabalha com a hipótese de que uma só onda tenha sido responsável pela destruição. Ele explica que, apesar de o litoral sul do Brasil ser afetado por ressacas, elas são formadas por séries de ondas, ao contrário dos tsunamis - uma única e devastadora onda. "Os registros históricos são pobres, mas dão conta de que uma única grande onda arrasou a vila", diz Mahiques. Outra possibilidade, diz o oceanógrafo, é a de que um enorme escorregamento no talude (a escarpa submarina que vai da plataforma continental à zona abissal, 250 km mar adentro) possa ter gerado o fenômeno.

Uma ressaca das bravas

A ressaca é gerada por fatores externos sobre o mar. O maremoto tem causas endógenas, como terremotos. O efeito de cada um depende da magnitude. Apesar de, por vezes, grandes marés meteorológicas poderem ter impactos similares a maremotos, as consequências costumam ter maior distribuição espacial. "Suas ondas são provocadas pelo deslocamento do assoalho oceânico e propagadas em todas as direções, podendo atingir regiões bastante distantes", diz Eduardo Siegle, da pós-graduação em Oceanografia da USP. Um maremoto, como o que ocorreu em 2011 em Fukushima, no Japão, propaga-se a centenas de quilômetros por hora. Quando atinge a costa, pode levar a uma sobrelevação do nível do mar de até 20 m. Sem falhas geológicas no Atlântico Sul, as chances de um evento assim na costa brasileira são mínimas. "Com base em evidências históricas, é pouco provável ter havido um maremoto", diz Marcelo Assumpção, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP. "Se ocorreu ou não em 1541, a chance de acontecer de novo é mínima, de uma vez a cada 10 mil anos."

Boa Noite

!"Boa noite pra você que sorri, que chora, que se alegra que se entristece, boa noite pra você que vive!!!!!